Para entrarmos mais fundo no tema abordado no nosso especial sobre as ações institucionais da PUC Goiás na última década para a inclusão de estudantes de camadas populares na universidade, conversamos com a professora dra. Cláudia Valente, titular no Programa de Pós-Graduação em Educação. Ela foi a orientadora da dissertação Acesso, permanência e perspectivas de futuro: os enfrentamentos do (as) jovens do Vestibular Social da PUC Goiás, que apresentamos aqui. Confira como foi o papo:
PUC VC: A discussão sobre a inclusão, acesso e permanência dos estudantes de camadas populares tem sido uma questão na universidade e uma crescente no Brasil. Por que acha importante debatermos isso abertamente?
Pelo direito à educação. Se a gente pensa na educação como um direito, então a gente pensa que todas as pessoas devem ter acesso e permanência com qualidade em todos os níveis do ensino. Como vivemos num país marcado pela desigualdade social, as políticas afirmativas visam aparar essas arestas dessas desigualdades sociais que são materializadas, inclusive, no acesso à educação.
Temos aí uma angulação, esses sujeitos que não tinham espaço têm agora esse espaço. Temos que compreender quem são esses sujeitos, qual suas necessidades, para poder desenhar uma nova maneira de fazer inclusão social dentro da universidade. Isso tem ocorrido em outros níveis de ensino também. As políticas públicas têm alterado a realidade brasileira.
PUC VC: Quem é contrário ao discurso de inclusão costuma falar em meritocracia ou ainda citar os cursos técnicos e profissionalizantes como uma caminho e não a “universalização” do ensino superior.
A meritocracia é um discurso para destacar as desigualdades. De quem tem direito a ter acesso dentro do sistema, baseado na ideologia do dom e da oportunidade, como se todos tivessem oportunidade e alguns se sobressaem porque têm mérito. Não é só o acesso à universidade. Chegar a esse acesso é o verdadeiro problema. Aqueles que chegam (terminam o ensino médio) também passaram por uma seleção.
São discursos construídos para justificar quem são aqueles que justificam o acesso à universidade e aos próprios cursos. São construções discursivas que justificam quem tem acesso e pode permanecer nesse lugar.
E existe uma seleção mesmo nas políticas afirmativas. Não é uma seleção universal, ela é uma seleção com os seus pares.
PUC VC: O trabalho de mestrado que a senhora orientou cita que os estudantes dizem ver no ensino superior uma oportunidade de ascensão social. Mas também citam dificuldades de aprendizado, falta de acolhimento por alguns professores e até mesmo falta de tempo (conciliar com trabalho) e de mobilidade. O ensino superior faz a diferença no nosso mercado de trabalho?
Um país que tem mais pessoas com ensino superior vai ter uma compreensão melhor do que é uma democracia, do mundo. Eu penso que o ensino superior qualifica para o mundo, com uma formação humanística e, pensando nisso, nesse país, melhor do que nunca isso faz a diferença. Sou totalmente contra desse discurso de que a universidade não é para todos. A universidade é um espaço para além da formação para o trabalho, é para um olhar mais crítico do mundo.
Talvez, no primeiro momento, os jovens busquem a ascensão social. Há uma expectativa muito grande em relação à escolarização. Jovens de camadas populares depositam uma esperança muito grande. É um espaço de debate, de formação, que também faz parte desse universo de formação para o trabalho. Nossa missão é ampliar a visão desse jovem.
O mercado de trabalho é muito flutuante, muito dinâmico, temos que garantir que esse estudante terá habilidades e reflexões para compreender a dinâmica do mundo, para que saiba viver nesse mundo de tanta mudança.
PUC VC: A PUC foi a primeira universidade goiana a aderir ao Prouni e, depois, criou o Vestibular Social e um programa próprio de financiamento. Acha que a universidade caminha de alguma forma para a inclusão? O que poderia ser melhor? O que a senhora já avalia como bom?
Tem várias formas de acesso. Um problema em várias instituições é a questão da permanência, que se discute em todas as esferas. É sempre algo que ficamos pensando, de que forma podemos garantir uma permanência não só material como simbólica. É uma preocupação sim. Engajar o aluno na instituição, para além do ensino, o que dá o sentido de pertença e que dá um outro sentido na sua formação.
Vamos pensar assim: temos a questão institucional que a PUC oferece, as várias frentes que existem enquanto universidade, mas, também, eu penso que temos um colegiado de professores de um curso que deve levar em consideração ou que discuta essas questões. É uma combinação complexa de fatores. Tem professores que têm papel inspirador para que esse aluno encontre sentido naquela formação. Contudo, não podemos depositar a esse professor ou professora essa responsabilidade no processo. Ele/ela é um dos agentes de transformação. O estudante também é agente ativo nesse processo. Nosso papel é abrir, na universidade, essa oportunidade.