Gilza Melo, autora da dissertação que investigou os desejos e frustrações dos concluintes do Vestibular Social Foto: Ana Paula Abrão

Pesquisa investiga dificuldades e perspectivas de bolsistas concluintes

O êxito com o Vestibular Social fez com que a PUC Goiás apresentasse o projeto para outras universidades, dentro e fora do Brasil, além de ter gerado pesquisas científicas baseadas em suas contribuições e limitações para estudantes goianos e suas famílias.

Como lembrou a pró-reitora de Extensão Márcia de Alencar em entrevista ao nosso especial, a PUC Goiás sabe, desde o início, que o Vestibular Social sozinho não consegue responder toda a demanda de jovens de camadas populares que querem ingressar no ensino superior em Goiás, mas faz a diferença na vida de todos aqueles que alcançam esse objetivo com o programa. Essa tese se confirmou na dissertação de Gilza Carla Temoteo Melo, administradora e pesquisadora que integra o time da Pró-Reitoria de Graduação da universidade.

Com o trabalho Acesso, permanência e perspectivas de futuro: os enfrentamentos do (as) jovens do Vestibular Social da PUC Goiás, orientado pela professora Cláudia Valente Cavalcante defendido no curso de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da universidade, em 2019. Na dissertação, Gilza aborda tanto a questão histórica do projeto e seu contexto como os dados já disponíveis em, então, 9 anos de Vestibular Social.

Dificuldades

Até a conclusão de seu estudo, mais de 4 mil diplomas de bolsistas já haviam sido expedidos. Em nosso levantamento neste especial do PUC VC, mostramos que ao menos 95 mil matrículas e rematrículas foram feitas com a bolsa até o início de 2020. Levando em conta a duração média de quatro anos para um curso superior, o que daria uma matrícula e sete rematrículas para cada estudante, podemos imaginar que nem todo mundo que ingressa com a bolsa conclui o curso – isso nos levaria a pouco mais de 11 mil estudantes no período. A média de estudantes regularmente matriculados com a bolsa é de cinco a seis mil estudantes – em 2020/1, foram 5.530. Se quatro mil se formaram durante a década, sobram pouco mais de mil estudantes perdidos nesses dados.

A mestra em Educação analisa, em sua dissertação, que o programa não tem sido garantia para a não evasão nos cursos de graduação da universidade, mas se mantém como uma estratégia para permitir o acesso e permanência de jovens da camada popular na universidade. “Nas entrevistas, ouvi muitas histórias. Chegamos a chorar com os relatos”, lembra Gilza. Em seu levantamento para a dissertação, a pesquisadora destacou que cerca de 80% dos estudantes com o benefício são jovens.

Buscando a resposta nos jovens concluintes

Para não se basear apenas em dados, a pesquisadora partiu para a escuta e buscou conversar com esses jovens. Selecionou 481 concluintes e, desses, 120 jovens de 18 a 28 anos aceitaram participar. Dos respondentes, 70% foram mulheres e 65% se declararam pardos (as) ou pretos (as). A maioria residia em Goiânia (87%) e estava solteira (81%). Pouco mais de 54% utilizam o transporte público para chegar à universidade (e 75% contam com o benefício do “passe livre”).

Um dado que salta aos olhos é o fato de 63,5% dos concluintes serem os primeiros de suas famílias a estarem próximos de concluir um curso superior. Entre suas maiores dificuldades e esforços para continuar cursando e concluir o curso, mesmo com bolsa, os jovens destacaram a questão financeira (76%), a falta de tempo (43%) e a dificuldade de aprendizagem (14%).

Os dados não chocaram a pesquisadora, pelo viés da bolsa concedida: uma entrevista socioeconômica é feita com cada candidato para garantir que jovens de camadas mais populares – e, consequentemente com menor renda familiar e oriundos de escolas públicas – tenham acesso ao benefício. O que a surpreendeu, diz, foi o nível de insegurança dos jovens e a pressão que sofrem por serem os primeiros membros “qualificados” em suas famílias. No estudo, 90% dos jovens disseram ter medo de exercer a profissão após a conclusão do curso e 96% quer continuar estudando após a graduação. “Nas entrevistas, eles afirmavam que isso não era ligado necessariamente ao curso, porque consideram o ensino bom. Percebi que está mais latente neles a insegurança e a incerteza por não terem, após o término, uma perspectiva de futuro, uma segurança. Eles são os primeiros graduados de famílias humildes, então existe uma expectativa muito grande”, explica.

Durante a pesquisa, a mestra em educação também percebeu a tendência desses jovens em aproveitar melhor a oportunidade de estudos. No grupo pesquisado, o bom desempenho acadêmico é uma marca e o diploma é visto como uma oportunidade de ascender em busca de uma “dignidade” que projetam para o seu futuro: mestrados, doutorados, estabilidade financeira, bens etc.