Tese de doutorado debate o imaginário social sobre pessoas com deficiência

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, estipulada pela Organização das Nações Unidas (ONU), busca assegurar os direitos humanos e a equidade às pessoas com deficiência, através da promoção do respeito e da dignidade às mesmas, para que sejam, antes de tudo, tratadas como indivíduos.

No entanto, essa prática ainda não se mostrou efetiva dentro das relações humanas. É o que comprova os estudos da professora do curso de Design da PUC Goiás, Ana Bandeira, ao analisar a construção de imaginários na sociedade em relação a pessoas com deficiência.

Em sua tese de doutorado, ainda em desenvolvimento, é estabelecida uma condição de existência para os corpos com deficiência, denominados de dissonantes. Essa condição vai além da dimensão biológica, empregando valor afetivo, cultural, estético e lúdico à constituição física.

“De maneira geral, a discussão promovida na minha tese a respeito do corpo com deficiência se dá pelo imaginário criado em torno deles e como a sociedade de não deficientes se coloca nessa relação”, afirma.

A pesquisa compreende o papel da comunidade voltada ao trato de corpos dissonantes diante dos imaginários já estruturados dentro dela. Realidade alimentada por intermédio de projeções realizadas pela mídia audiovisual.

Um dos enfoques da análise está voltado para os corpos de paratletas, sujeitos que estipularam uma nova idealização corporal, tornando-se uma alternativa aos já padronizados corpos atléticos. Em ano de Jogos Parapan-Americanos, onde o esporte brasileiro estabeleceu novos recordes com 343 medalhas, sendo 156 de ouro, 32 a mais em relação a última edição; o debate passa a ser fundamental.

“Existe um tipo de narrativa presente na comunicação a respeito das Paralimpíadas, onde a televisão vai projetar por meio de canais específicos a ideia de um atleta heróico, por conseguir alcançar aquilo que outros não conseguem. Só que as pessoas com deficiência não querem ser vistas como heróis, mas apenas como atletas”, explica.

Essa linguagem potencializa o imaginário das pessoas, que acabam desenvolvendo barreiras atitudinais, explicadas por relacionamentos capacitistas à volta de indivíduos com físico limitante. Tais atitudes reverberam novos ideais estereotipados para outros grupos de dissonantes, desencadeando expectativas que muitos não conseguem alcançar.

“É através das narrativas que eu projeto uma imagem da deficiência, ela é uma das responsáveis por compor esse imaginário social, que por muitas vezes acaba gerando essa concepção de imaginário”, disserta.

O papel do Design

Docente efetiva no quadro da Escola Politécnica e de Artes, Ana leciona no curso de Design desde 2016, onde ministra aulas relacionadas ao desenvolvimento de projetos, composição visual e layout. Já ministrou a disciplina essencial para a graduação, chamada Design Universal, responsável por abordar questões voltadas para acessibilidade e no desenvolvimento de produtos inclusivos para minorias.

Seu interesse pelo tema surgiu justamente da necessidade de compreender a função do design na acessibilidade e inclusão.

“Em uma perspectiva do design, as próteses podem ser feitas de uma forma a conversar com a identidade do seu usuário, trabalhando com a imagem que ele quiser. Essa diferença interfere até na produção de produtos para a área de tecnologia assistiva. Nós queremos compreender qual perspectiva deve ser utilizada em um momento específico”, comenta.

A ética profissional vai para além da funcionalidade, pensando na visualidade e na incorporação de uma identidade estética peculiar ao usuário das ferramentas assistivas. Ressignificando a existência desses corpos ao trabalhar com o desejo do consumidor, e não com uma perspectiva estigmatizada.

Metodologia

Para compreender o impacto do imaginário social dentro das comunidades, Ana realiza uma análise de conteúdo descritiva a partir de entrevistas, remotas e presenciais, efetivadas durante sua pesquisa de campo. Ao todo foram entrevistadas 19 pessoas, divididas em 4 perfis: pessoas sem deficiência, com deficiência, paratletas e artistas cênicos.

O intuito estava em observar como as pessoas sem deficiência viam os corpos dissonantes, passando pela percepção das pessoas com deficiência, paratletas e artistas. Na intenção de encontrar diferenças nessas percepções e como o imaginário possibilita que esses grupos as realizem, Ana construiu um diário de campo por considerar essencial enfatizar a sua experiência sobre o tema, dando voz para pessoas que realmente vivem tal realidade.

“Dentro da análise de conteúdo eu vou identificar as falas, os questionamentos e as concepções em relação ao imaginário. Foi a partir dessas entrevistas que eu pude compreender que não existe um imaginário, mas sim vários a respeito desses corpos. Que estão relacionadas às histórias, à mídia e nas relações que essas pessoas têm”, conclui.

Currículo

Ana Paula Neres de Santana Bandeira é graduada em Design de Comunicação pela PUC Goiás (2004). Especialista em Publicidade e Audiovisual pela PUC Goiás (2007). Mestra em Arte e Cultura Visual pela UFG (2007). Doutoranda em Performances Culturais na UFG. Atualmente  coordena o departamento de produção do Centro Integrado de Aprendizagem em Rede (CIAR-UFG), e atua como docente do curso de Design da PUC Goiás.

Texto: Juliano Cavalcante, estagiário da Dicom

Foto: Wagmar Alves